quarta-feira, abril 15, 2009

Por onde andas?

i
l
Uma palavra não é uma palavra.
Se uma palavra fosse apenas uma palavra,
uma palavra nunca conseguiria ser uma
palavra. Haveria dentro ou fora
ou ao lado
ou por cima dela
toda a brutalidade da coisa que é apenas
a coisa que é.
Uma palavra são sete letras. Quatro consoantes e uma vogal.
Uma vogal que colocada em três sitios diferentes
soa de três modos distintos e por isso
bem se pode dizer que
a palavra tem a ressonância de três letras numa só vogal.
Não se trata de uma questão artitmética.
Nem literária.
Não há disciplinas que suportem o silêncio do sentido.
Há a palavra,
o palavrar,
o palavreado,
o palavroso,
o distinto enumerar
do cansaço com que uma palavra pronuncia o sentido,
o som,
a matéria a que se refere.
Deveríamos ter inventado palavras substitutas.
E elas existem, claro.
Há sempre outras palavras para exprimir as palavras,
o seu som,
sentido,
significado.
A palavra sinónima irrita-me. Exprime com polidez
o acordo que não há,
que chega sempre atrasado às palavras.
Não me atrai mais a antónima.
É um truque, uma birra de crianças desavindas na biblioteca.
Não há remédio que salve a palavra. É por isso que
quase sempre
a encontramos muda,
silenciosa, inexpressiva,
cobarde.
As palavras deveriam ser de vidro,
do cristal mais puro,
para se poderem partir e depois,
em cacos,
ficarem a ressoar,
esmagadas contra o chão.

1 comentário:

Anónimo disse...

Muito bonito. Obrigada por partilhares :)