Foi ao fim da tarde, pelo Skype, que o alívio chegou. A voz da minha cunhada explicando que fora uma televisão e alguns objectos caidos ao chão, não tinham mais nada a registar senão o maior susto das suas vidas. Lá em casa o tremor de terra foi sentido de maneiras diferentes. O meu irmão julgou que estava num barco, agitado pelas ondas. Nem acordou. A minha cunhada agarrou na filha que entretanto acordara, assustada, e, meio aos trambolhões contra as paredes, desceu ao rés-do-chão, precipitando-se para a rua. Ao abrir a porta e vendo o carro literalmente aos saltos percebe que não é boa ideia sair, pode ser apanhada por alguma fenda. Lembra-se daquele estado de não saber o que fazer. É o que custa mais, percebe-se. A minha sobrinha também tem a sua visão do que aconteceu: " mãe, o vento era tão forte que partiu coisas cá dentro de casa, não foi?" Foi assim o terramoto lá em casa, num bairro residencial de Santiago do Chile. A oitenta quilómetros, um dos armazéns em que o meu irmão trabalhava, desapareceu completamente. O outro tinha danos gravíssimos e não se sabia quantas pessoas podiam estar lá dentro e em que condições. A seguir aos dois minutos e pouco, que pareceram uma verdadeira eternidade, foi a debandada geral. Estavam a fazer o contacto telefónico com cada uma das famílias. É a minha cunhada que nos conta isto, entretanto toda a família está numa estranha conferência telefónica que cruza Lisboa e Santiago do Chile. Conferimos notícias, o tsunami, o abalo, o número e intensidade das réplicas,a casa sem nenhuma fenda, a parte mais velha da cidade muito destruída. De repente, quanto é a vez de nos despedirmos, ouvimos as vozes das crianças, numa triangulação entre Lisboa e a capital chilena. E aqueles risos das crianças, aquelas vozes, mesmo que meio deformadas pela linha skype, são tão importantes para restaurarem a ideia de que tudo pode mais uma vez ser recomeço.
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