quarta-feira, março 31, 2010
Ilhéu
Estou cercado de mar. Ponho três pedras no Jameson. Como se fosse um náufrago. Sabe-me bem o balancear das águas. Balanço eu também. Faço-me de pequenas impressões. Coisas pequenas que acontecem durante o dia. O palco outra vez a encher-se. Não tarda vem aí o D. Quixote. Estamos a trabalhar com pequenos grupos, que acompanham o processo criativo do Bando. Já fomos a Vale dos Barris, a esse refúgio que, há doze anos - vai fazer doze anos que acabou a Expo 98 e que o Bando começou a projectar-se do outro lado, a olhar Palmela, os campos, a península - é a sua casa. Vir um grupo como este para o teatro onde trabalho é semear os meus dias de interpelação, de vontade de querer fazer melhor. Já me esqueci da melancolia com que estava a querer começar o texto, o post. O gelo a derreter-se. Eu gostava de ser capaz de pensar um pouco mais mas não consigo. Ou não sei se quero. Não se consegue pensar nada quando se está sozinho. Ou consegue-se, mas é um pouco estéril. Há dias que voltei a escrever aqui no blogue e quase ninguém passa por aqui. Vou pôr mais uma pedra no Jameson. A verdade é que eu próprio já não consigo reeditar o fascínio que tenho por escrever no blogue. Fazê-lo significa que eu trabalho este ardil de pensar que tenho algo para dizer quando sei que não tenho. Quer dizer, ainda não desisti do mundo: se me sentar a escrever uma fala para ressoar no tempo teatral, aí acho que posso ser-vos útil. E o tempo do teatro está aí, cada vez mais urgente. A crise é boa para o teatro. As pessoas ficam insatisfeitas, começam a coçar-se, a ficar nervosas, a quererem estar umas com as outras, a solidão começa a ficar muito ruidosa, é a hora do palco e o palco é essa passerele por onde tu, eu, nós, passamos. Mas a blogosfera, confesso que é como este Jameson, tenho dúvidas. Entretanto, vou buscar mais uma pedra de gelo. Está quase no ponto. O problema é que não vimos aqui para escrever. Nós estamos aqui. Na sala ela está a ouvir uma música, a ler um livro. O problema é esse: há tantas coisas para deitar as mãos, livros, músicas. E pessoas? Ontem fui a cinema e quando vinha subindo a Gran via da nossa cidade, havia corpos deitados sobre a rua. Um sem abrigo ressonava, tinha o pé de fora. Hesitei entre o tapar, entre fazer-lhe cócegas ou simplesmente, seguir em frente. Segui em frente, claro. Perdi o interesse pela blogosfera? No outro dia o guarda-rios foi-se embora, apagou o seu rastro, deixou apenas um adeus. O que não temos faz-nos falta. Tu, que nunca passaste por aqui, que nunca escreveste aqui nada, fazes-me falta.
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2 comentários:
Estamos aqui JPN, mesmo quando não comentamos. Mas isto é só um modo de estar perto, mas não é na verdade companhia.
Abraço
~CC~
Não sabia que o guarda-rios tinha desistido. Passei realmente muito tempo fora da blogosfera.
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