quinta-feira, abril 01, 2010

A liberdade dele

E ele a explicar-me, enquanto trazia o táxi aos solavancos pela Avenida Infante D. Henrique, sabe, tenho saudades daqueles tempos quando eu era catraio e vinha à noite ver um cinema ao Império, ou comer um bife, e tudo era seguro, outra gente, percebe? Isto nunca se há-de contentar todos. Olhe, eu agora não sinto liberdade nenhuma, sinto-me preso, vem aí o verão e é uma tristeza, no inverno vá que não vá, ainda parecemos pessoas normais, somos velhos, está frio, temos de ficar em casa, é natural. Mas e agora com o verão? Você sabe alguma coisa de estatísticas? Não? É pena. Eu acho que noventa por cento dos velhos que morrem no verão é de tristeza. Vem aquele calor, os netos, os filhos, toda a gente a suar e eles ali na sombra das casas, estamos a falar de velhos cujas casas não têm ares condicionados, nem nada, entende? O verão é muito ingrato para nós. De dia não se pode sair à rua, é o calor, há noite, são os bandidos! Eu acredito que havia muita gente que queria falar e não podia e até os admiro por isso, esses conquistaram a liberdade, fico contente por eles, não me interprete mal, não sou saudosista, o Salazar era um tirano, mas eu. na minha vidinha simples de quem não tem nada para dizer de mal sobre ninguém, nem antes nem depois, tinha mais liberdade naqueles tempos.

1 comentário:

Anónimo disse...

Para quê ter asas sem poder voar?