
A Isabela, contra o que é seu hábito, ligou-se a este texto da Sofia Loureiro dos Santos, e ainda bem, porque senão talvez me passasse despercebido. Embora admire muito e goste de Defender o Quadrado nunca o linkei como devia ser. Preguiças, que não vêm ao caso e que em maré reformista deste blogue vou de imediato corrigir. É um texto que posso subscrever naquilo que julgo ser o essencial, ou seja "cada vez que se enaltecem as qualidades das mulheres que cuidam dos seus rebentos, que quereriam estar em casa 6 meses, 8 meses, 12 meses, para amamentarem, para darem papas e banhos e para assistirem ao gatinhar, ao rir, ao andar dos seus rebentos" se está a proceder a "uma lavagem ao cérebro da sociedade ensinando às mulheres que a sua função primordial é procriar, amamentar e acompanhar os filhos, e que só o não fazem por razões económicas." É uma mensagem subliminar que está presente também em muitos discursos publicitários, o que me arrepia muitas vezes já que a publicidade é um bom barómetro para se perceber as configurações ideológicas de uma determinada comunidade já que ela, regra geral, excepto em mensagens dirigidas a públicos alvos mais jovens, é muito conservadora. Arrepia-me ver anúncios em que a felicidade feminina é suportada pelas novidades das fraldas, dos detergentes de máquina ou pelos sorrisos de plástico do marido diante de uma lasanha estaladiça.
Gostava no entanto de acrescentar uma coisa: cada vez que há uma mexida na regulamentação da maternidade e natalidade exulto. Sou como muitos dos que me lêem sabem, pai divorciado. Não vem ao caso mas tive um excelente divórcio, aliás. Quando o meu filho nasceu estava ainda bem fresca a nova lei que regulou o apoio à paternidade. Vistas pelas políticas de hoje eram mais estreitas essas leis e decretos. Eram tão novas que o meu Serviço de Pessoal olhou para mim como um burro que olha para um palácio, perguntando-me, " tem a certeza que isso já está em vigor?". Ou seja, pelo lado do argumento da Sofia, ainda sublinhariam mais a função reprodutora da mulher como base da sua identidade comunitária. Só que eu lembro-me como as senti como uma janela aberta para poder crescer como pai. A mãe do meu filho quando acabou a gravidez teve uma outra oportunidade de trabalho e eu aproveitei para pedir horário contínuo e o desconto de uma hora e lembro-me como essa pequenina hora, sessenta minutos, significou quase tudo na minha vida de então: chegava à creche por volta das cinco da tarde e íamos passear os dois pela avenida da igreja, comer um queque na biarritz. Lembro-me de quase tudo: de quando ía ainda de carrinho, de quando já me enfiava o dedo indicador na minha mão, do orgulho que sentia a ir pela mão do meu filho. E lembro-me também da cara inédita do chefe de pessoal. E da pedagogia que acabei por fazer para outros colegas, homens que se interessavam mais pelas possibilidades de abrir a sua paternidade a uma nova condição. Não estou a contra-argumentar em relação ao que disse a Sofia. Sou aliás contra a falácia argumentativa. As questões não se subscrevem apenas pelo exacto mundo que alimentamos através das nossas experiências pessoais. Quero apenas testemunhar que sermos melhores pessoas, sermos melhores homens e melhores mulheres, é trabalho conjunto. Aquilo que liberta a mulher, liberta-me a mim que sou homem. E foi por isso que no outro dia quando vi as novas propostas sobre a politica de natalidade exultei mais uma vez. Não por mim que já não as vou utilizar mas por mim que beneficio do mundo onde vivo.
Imagem: Desenho do Pedro, aqui