domingo, abril 01, 2007

O Coronel Pássaro

A peça de Hristo Boytchev lançou-o na dramaturgia contemporânea. É impressionante o trajecto e o currículo que este texto fez na cena internacional. Subiu ao palco mais de trinta vezes em 25 países. Ganhou prémios como o British Coucil e o Enrico Maria Salerno, dois prestigiados prémios em Inglaterra e Itália, respectivamente. O percurso de Hristo Boytchev também é curioso. Aos quarenta e seis anos este engenheiro de profissão, que estreia o seu primeiro texto dramático com trinta e quatro anos, ganha um subsídio estatal para realizar o filme O coronel pássaro. O ano de 1996 será aliás um ano distinho na sua biografia. Torna-se autor e apresentador do seu programa de televisão e candidata-se a presidente da república búlgara, utilizando o tempo de antena para realizar um happening político-cómico (trinta dias em prime-time) e acaba por conquistar aproximadamente 2% dos votos (terá sido a fonte de inspiração do nosso Manuel João Vieira?). É depois disso que O Coronel Pássaro tem a sua impressionante ascenção na cena teatral internacional. O texto debruça-se sobre a vida num asilo psiquiátrico perdido num Mosteiro, instalado numa zona sem fim, quando aí chega um novo psiquiatra. Os loucos sobrevivem porque a população lhes traz madeira e comida, quando vêm ver as notícias na única tv existente nas redondezas, pertencente a um dos loucos. A televisão não tem som mas como ele aprendeu a ler nos lábios recita as notícias, as falas dos personagens dos filmes. A sua transcrição de Casablanca é um momento de grande comicidade. No asilo a vida passa-se ocupando-se com as diferentes paranóias de cada um deles. Um está imóvel durante toda a primeira parte, com um olhar catatónico, sendo revelado apenas pelo que dele dizem. Outro tem medo que o mundo o esmague, o pise, e por isso constrói um abrigo com a sua cama. Outra era a Maria Madalena de uma fronteira onde paravam os camiões de pesados. Atemorizada pela sua vida luxuriosa arrasta-se agora, mais à sua cruz, por aquele asilo perdido. Um era um ladrão incorrígivel e incontrolável. Havia também o velho cigano que se vinha tornando impotente. O homem tv, o tal da tradução simultânea. Os homens e a mulher dormiam todos no mesmo quarto, para se abrigarem do frio, já que a madeira escasseava. A vida desta pequena comunidade é alterada quando caixotes das Nações Unidas destinados à Bósnia se despenham nas imediações do Asilo. Fardamento e alimentos que tornariam autónomo o asilo por vários anos. Num ápice os loucos transformam-se em garbosos militares sobre as ordens do coronel Fetissov, que tinha estado completamente imóvel e que se vem a descobrir ser uma importante patente da aviação russa. Este coronel consegue também criar um delírio entre todos, que esquecem as suas paranóias e vão sair do Mosteiro em busca da sua loucura, acabando por integrar o psiquiatra, que se apercebe que pouco rendimento teve por ter seguido a razão humana. O texto apresentado agora pelo Teatro da Rainha, numa co-produção com Al-Masrah e Odivelcultur, tem encenação de Fernando Mora Ramos, cenografia de José Carlos Faria, música de Carlos Alberto Augusto e interpretação de José Eduardo ( Davud), Vitor Santos ( Fétissov), Isabel Lopes (Pepa), Jorge Estreia (Matei), Carlos Borges (Hatcho), Pedro Ramos (médico), António Plácido (Ilya)e Octávio Teixeira (PeKto). Estreou a 8 de Março no CCB e está ainda hoje, à tarde, no Teatro da Malaposta, dirigido pelo Manuel Coelho.

2 comentários:

CCF disse...

"Os homens e a mulher dormiam todos no mesmo quarto, para se abrigarem do frio, já que a madeira escasseava." :)Apesar dos seus abismos interiores eles sabiam algumas coisas importantes!
~CC~

JPN disse...

ou seja, também foste ver...:)