sexta-feira, março 05, 2010

A minha rua

É a Rua de Baixo. Sempre quis a fazer jornalismo teatral. Foi um dos motivos que elenquei para justificar a minha saída antecipada do DN Jovem ( naquela altura não sabia ainda que a maior motivação, era o de eu ser um desistente. Fiz-me desistente para não sofrer com o sentir-me a sombra do meu irmão. E ainda bem que não sabia: naquela altura teria sofrido muito com isso, tinha uma posição muito arrogante sobre a fraqueza, os fracos). Tinha acabado de fazer a cobertura do III Encontro de Expressão Dramática no Conservatório Nacional, tinha entrevistado o Ryngaert, a Gisele Barret, o Claude Vautelet. E a luta imenso para os textos sairem. Chateei-me. Nessa altura tinha começado a escrever na revista O Actor, onde podia escrever, escrever, escrever. O meu irmão era o Director Gráfico e a revista começara a nascer em minha casa, nas conversas entre ele e o Miguel Abreu, que começava a dar os primeiros passos com a Cassefaz. A edição era só de 500 exemplares, eram fotocópias A3 dentro de uma capa de um LP, feitas algumas delas à surrelfa num organismo público, era um brincadeira, mas publiquei lá algumas reportagens de grupos que já não existem. Sobre a Máscara Teatro Grupo, sobre o Teatro Espaço, sobre o fim do Contra Regra, sobre os épicos Encontros de Teatro para a Infância e Juventude, com entrevistas ao João Brites, ao Luis Aguillar e ao José Caldas. Um desdobrável de trinta e tal páginas onde ainda cabia um texto do Carlos Porto (que tinha desancado a revista no primeiro número, por ser uma coisa inconsequente, uma brincadeira, excepto a minha reportagem sobre a Máscara. Embora tenha feito coro com os outros, fiquei todo orgulhoso e lá pensei, o Porto nem é mau tipo.) Escrevi também um texto, reflectir sobre a escrita teatral, onde desancava, à minha maneira, na crítica que se fazia. Tenho de reconhecer que, infelizmente, mantenho o essencial da crítica: o poder da critica teatral num jornal é inversamente porporcional ao peso editorial do teatro no mesmo. Quanto menos reportagem, quanto menos entrevistas, quanto menos notícias, mais ele está dependente de uma critica que muitas vezes não sabe reconhecer a sua impotência e a transforma em soberba. Era assim a crítica desta altura. Hoje já não escreveria o mesmo. Verifico haver criticos que se preocupam em começar por enquadrar informativamente o espectáculo, deixando escapar lá para o final um pequeno apontamento ou sugestão de leitura. Agrada-me isso. Poderia falar mais sobre isso, até de uma outra perspectiva, trabalhei recentemente, durante muito pouco tempo, é certo, em assessoria de imprensa. Fiz o percurso inverso e pouco usual, hoje nos ensaios de emprensa encontro-me com os jornalistas que convidava para irem assistir aos espectáculos que divulgava. Mas falava eu da Revista O Actor. Quando ela acabou tentei fazer um projecto, Revista de Teatro, que era feita num grupo que tinha editado a Revista de Cinema, e onde estava o Jorge António, realizador de quem fiquei grande amigo. Esteve quase a sair, mas eu tinha posto para mim, como fasquia, que só avançaria quando tivesse a edição de 4 números garantida. Consegui ter um e meio e desisti. Era um projecto editorial que não valia a pena ser feito senão fosse para criar mesmo um espaço de reflexão e investigação. Tenho os meus arquivos cheios de revistas que fazem cinco ou seis números, muitos deles excelentíssimos, mas que depois acabam. A Revista de Teatro do Norberto de Ávila, a do TEUC, os Ensaios do Teatro de Viana, a Adágio de Évora, os Percursos da APED. E outras, bastantes outras. Sobrevivem ainda as dos Artistas Unidos, creio. Depois disso ainda escrevi na Revista Ego, quer dizer, tinha lá o nome mas verdadeiramente só escrevi um texto, e não foi publicado porque a peça, no Teatro Aberto, saiu de cena, depois da morte abrupta - e não o são todas?!- do Carlos Daniel. E as minhas aventuras jornalísticas (ah, fui Coordenador do Jornal Teatro e Educação da APED, mas aquilo só teve um número) ficaram por aqui. Até que, estava a acabar o ano de 2009, o desejo de guardar os testemunhos de muitos dos protagonistas do movimento teatral dos últimos trinta, quarenta anos, me vez pensar em escrever. Comecei pela Tempo Livre e depois um pedido de colaboradores para a Rua de Baixo, fez-me avançar. E cá estou eu, sempre a aguardar com curiosidade a nova edição.

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