sábado, maio 28, 2011

Partido Socialista

Durante muito tempo invectivei o BE e o PCP por não terem sido capazes de criar um diálogo com o PS de modo a podermos ser governados à esquerda. Ao mesmo tempo que verberava o PS - Partido de Sócrates por estar a destruir o Partido Socialista. Chamei a isso "trair a esquerda", adoptando aqui a ideia de traição adoptada por Arno Gruen, que é a de traição a si próprio. Há finalmente dentro do Partido Socialista vozes que ao sugerirem que há mais vida no PS para além de Sócrates estão a dar cabo do seu principal sustentáculo retórico. Gostei também de ver Manuel Alegre a dizer que o Partido Socialista deve ir para a oposição. É outra forma de dizer que Sócrates deve ir embora. Escrevi-o segundos depois de Sócrates ter anunciado a sua demissão. A eucaliptização ideológica do Partido Socialista chegou ao extremo de levar personalidades com a importância política de Ferro Rodrigues a negarem uma possibilidade de acordo à esquerda, admitindo-o à direita sem perceberem que ao colocarem-se em linha com esse argumento - que já produzia sentido dentro do Partido de Sócrates- acabavam por dar razão ao BE e ao PCP. Um partido que assume à partida a sua incapacidade para dialogar com o BE e o PCP ao mesmo tempo que admite possíveis entendimentos pós eleitorais com o PSD e o CDS não merece, sobre nenhum ponto de vista, que se pense na utilizade de guardar o voto de um qualquer cidadão de esquerda. Esta "traição" é inesgotável e o dispositivo nem poupa aqueles que acolhe. Eduardo Graça (ver blogue Absorto aqui ao lado) chama a atenção para o facto de não se ter discutido o documento da Troika e de que Ferro Rodrigues ter sido um dos poucos que o tinha feito. Quando li isto perguntei-me de imediato: mas se o cabeça de lista da capital falou nisso então é porque o assunto terá sido discutido?! Só que depois caí em mim, ou melhor, no pleno do dispositivo da "traição": é claro que Ferro Rodrigues só foi ouvido quando disse que o PS não se aliava com o PCP ou com o BE. O resto não é agenda.
O drama de tudo isto - a tragédia não é chamada para a política - é que, para mim, a inutilidade do voto no PS é também a inutilidade do voto na esquerda. Uma esquerda inoperante do ponto de vista do governo é muito útil à direita até porque o esbatimento ideológico de hoje em dia faz com que os povos de esquerda e de direita possam convergir localizadamente em questões pontuais, fazendo com que estas ganhem evidência mediática, e esta evidência mediática será reutilizada descontextualizadamente. Por outras palavras, e como dizia Boaventura Sousa Santos no acampamento do Rossio: " De um Partido Finlandês recebi esta interpelação: " Boaventura, nós somos contra este empréstimo porque ele é usurário mas somos solidários com Portugal". Da mesma forma, em Portugal, a esquerda que estava contra o empréstimo defendia (no plano mais evidente mediaticamente, a concessão ou não do empréstimo) a mesma coisa que defendia a ultra-direita filandesa. E não é preciso dar exemplos tão rebuscados: todos contra Sócrates, quase faz o pleno da sociedade portuguesa não militante no PS. Nesse plano encontramo-nos todos aqueles que achamos que o Partido Socialista é a melhor plataforma política como aqueles que, à sua esquerda, acham que ele é tendencialmente de direita, como aqueles que à sua direita, o acham esquerdista. E todos nós não podemos fazer nada do que esta imensa coligação negativa que internamente reforça a liderança de Sócrates.
O drama do PS é que quem pode mudar Sócrates são os militantes do Partido. Este factor tem a ver com a falta de porosidade política dos partidos. Se o que se passa no Partido Socialista é central para a democracia portuguesa, para a esquerda portuguesa, seria curial que os seus militantes fossem também mais permeáveis ao que se passa na sociedade portuguesa.

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