Vou entrar em contra-corrente com muitos daqueles com quem geralmente estou de acordo. Já exprimi publicamente o que penso sobre a supressão do Ministério da Cultura e sobre a ideia de reduzir as entradas gratuitas nos museus. Confio na ideia dos especialistas de museus que já vieram dizer que, para além dos prejuízos na missão, há também a possibilidade de prejuízos financeiros ( não só as receitas não aumentam aquilo que se esperava com a cobrança dessas entradas, também porque elas podem provocar um efeito inibidor no acesso). São questões que para uma pessoa que falou tanto em avaliação...deviam ser melhor avaliadas. Mas não seria honesto se não dissesse que fui agradavelmente surpreendido por esta entrevista. Mesmo naquilo que é a questão mais crispada na relação que a esquerda e a direita têm com a cultura, os apoios públicos, FJV não se muniu de nenhum daqueles argumentos populistas que a direita muitas vezes emprega. Disse aquilo que qualquer povo de esquerda pode subscrever. E defendeu de forma sincera e honesta a sua ideia de cultura. É certo que repetiu aqueles slogans da direita sobre a cultura: o dinheiro dos contribuintes e o dinheiro dos contribuintes e ainda, o dinheiro dos contribuintes. Mas o que é que se esperava de alguém que é secretário de estado da cultura - advogando a supressão do Ministério - de um Governo de direita numa altura em que a escassez de recursos é a palavra de ordem?
Fiquei com algumas esperanças de uma coisa: o ponto de encontro entre a direita e a esquerda no que toca à Cultura é a questão da avaliação, da organização dos recursos, dos princípios de gestão. Gabriela Canavilhas era ministra da Cultura de um Governo do Partido Socialista num mandato governativo em que o primeiro-ministro assumira que o seu grande erro no mandato anterior tinha sido não apostar tanto na Cultura e aceitou cortes por percentagem nas verbas destinadas ao apoio à criação no orçamento da Cultura. Francisco José Viegas é secretário de Estado da Cultura de um governo do PSD/PP e diz, na entrevista, que não quer fazer cortes cegos. A mim, que a minha tribo política é cada vez mais a Cultura, Canavilhas, que era de um Governo em que eu tinha votado, desiludiu-me. E agora surpreendi-me agradavelmente com esta primeira grande conversa pública de Francisco José Viegas (cujo alinhamento à direita sempre me irritou). É a vida! O lado perverso disto tudo é que ele aceitou uma supressão do poder que um Ministério da Cultura pode ter em troca de um encontro semanal e intimo, num "conselho de ministrozinho" com Passos Coelho.
2 comentários:
A mim também me surpreendeu, até porque detesto políticos principalmente quando se intitulam de esquerda ou de direita, como se o bom senso pode estar sempre só de um dos lados....
Gostei de ouvir "Não há dinheiro, que parte desta frase é que não percebem", nitidamente o ataque aos esquerdistas e "Não vou substituir pessoas porque são competentes" um aviso aos boys de direita que salivam pelo poder.... a abertura foi boa, vamos ver se o resto da cena promete....
É curioso como as coisas são. A mim irritou-me profundamente. Desde a ideia peregrina de que houve um despacho ilegal ao apoiar a internacionalização da música por o Estado não poder ter parcerias com privados (nem vou falar do que são as Orquestras regionais ou Serralves, ou a Casa da musica, basta lembrar que até há umas coisas chamadas PPP - parcerias publico-privadas) até essa dos cortes não serem cegos - pois não, os teatros nacionais levam todos um corte "cego" de 20%, mas a DGLB tem o orçamento " mais do que duplicado" e os livros mantêm-se nos 6%. Para quem, antes de ser SEC, era editor livreiro... não é nada "cego" não senhor!
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