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quinta-feira, junho 10, 2010

Há muitos anos um amigo meu, cinéfilo de quatro costados, ensinou-me a ver uma ficha técnica. Tudo começou porque ele se manifestou contra aqueles bárbaros que se levantavam da cadeira do cinema logo que a palavra end surgia. Para ele era uma falta de respeito por todos aqueles que estavam envolvidos no filme. E porque eu lhe manifestasse algum estranheza por ele não compreender o aborrecimento do que seria estar sentado diante de um écran a negro onde escorriam dezenas de letras brancas, corridas em grande velocidade, ele explicou-me o que eu poderia ganhar, aguentando mais um pouco na cadeira. E eu agora já sei o que o filme, enquanto processo de fabricação da ficção se revela no correr longo e demorado de uma ficha técnica. Onde podemos perceber também o nível de sofisticação que o cinema atingiu, enquanto produção do imaginário. Ou a compreensão do peso fincanceiro que a indústria do cinema tem. O time code do telemóvel não enganava: tinham sido mais cinco minutos e trinta segundos de filme, que vi, sozinho, no escuro da sala. O que é perturbador é que grande parte da eficácia do cinema enquanto dispositivo de alimentação da nossa sede de imaginário, pode advir da forma como ela oculta o seu processo de fabricação. É claro que poderemos argumentar que não, que o making off é a desocultação do processo de fabricação. Não será assim, insisto. O making off, enquanto ficção sobre a produção do filme, faz, quanto a mim, parte do processo de ocultação que é necessário para que o filme apague as pistas sobre o modo como "ideologicamente" produziu sentido.

terça-feira, abril 14, 2009

O Leitor (e a vulgata)

Já há tempos que me andava a convencer para irmos ao cinema às 19h. Nunca me dava jeito. Mas ainda bem que consegui. Saí do trabalho a correr, apanhámos engarrafamento no Príncipe Real e quando lá chegámos só havia o Grand Torino para ver. Não nos pareceu mal, já que ambos apreciamos Clint Eastwood enquanto realizador e, nesta fase, enquanto actor. Acho que já escrevi isso aqui, ele a mim causa-me uma emoção redobrada pois este homem com mãos de veias salientes e nós dos dedos bem desenhados faz-me lembrar o meu avó materno. A verdade é que duas horas depois, quando saímos, sabia-nos a pouco. O filme Gran Torino é vulgar, o argumento é disciplicente e preguiçoso, vive demasiado dos seus apprioris. Mas como eram ainda nove horas propus mais uma sessão. O Leitor. Um filme comovente, verdadeiramente notável. No argumento, na música, na fotografia, no cenário, na realização, na interpretação, especialmente a de Hanna Schmit e a de Michael Berg em miúdo. Estava com alguma curiosidade, depois de ter visto alguns comentários e posts aqui na net. Que não compreendo. Lembro-me apenas daquela frase de Michael Berg, quando lhe perguntaram se aquela relação lhe fazia mal e ele respondeu que lhe parecia insignificante o mal que ela lhe podia ter causado quando tinha provocado tanto sofrimento a tanta gente. O Leitor é uma deliciosa história de amor. Um amor assim leva-nos pela vida, nunca nos larga, mesmo quando as circunstâncias de nós já se apartaram. Um amor assim é o nosso respeito ( e não condescendência) pela nossa memória.

quinta-feira, outubro 30, 2008

Paris, o filme

Para além de Paris - como se se pudesse dizer de ânimo leve para além de Paris - "Paris" de Cédric Klaspisch é um filme maravilhoso como o assinalaram os leitores do Público, em evidente divórcio com os críticos de cinema deste jornal. Não só pela presença de Juliette Binoche, Romain Duris, Fabrice Luchini. Ou Maurice Benichou que conheci aqui neste teatro, aquando da apresentação de "O homem que confundia a sua mulher com o chapéu", encenação de Peter Brook. É pela forma como o filme se constitui, se levanta enquanto estória: há um olhar de mirone que parece ligar tudo a partir de uma varanda, de um balcão de uma padaria, de um corredor de hospital, e, para mim o que eleva este enredo, é um olhar de despedida da vida e, porque é assim que sabemos viver, de encontro com a própria vida. Há uma elegância na construção, uma dignidade no cruzamento dos personagens, que encanta. Ou que me encantou, para ser mais exacto.

quarta-feira, julho 04, 2007

Henrique Viana

Este ano vai faltar ao almoço anual da Sociedade Guilherme Cossoul,
à qual, com muitos nomes importantes da nossa vida teatral, esteve ligado. Há alguns anos, no almoço de Natal, tive a sorte de ter partilhado a mesa com ele e com o Raul Solnado. Foi um grande prazer.

domingo, maio 13, 2007

Julia Roberts

Entrei a meio e saí antes dele acabar. Fiquei com a sensação de ter visto o filme todo na cena do primeiro beijo entre a Julia Roberts e o Hugh Grant. Aliás, para ser exacto, o filme desvendou-se-me quando Julia Roberts tirou os óculos escuros e levantou os olhos. Aquele olhar é um desejo, um sonho, como se dizia nas reuniões clandestinas, todo um programa de vida. Eu espanta-me como é que há gajos ainda que sonham com mamas.

A última frase

Apanho a últimas frase de Tom Hanks, num filme do qual não sei mais nada. Ele entra num taxi, e quando o taxista lhe pergunta para onde quer ir, ele diz para casa, e o taxi avança por uma avenida do centro de New Yorq. Estas coisas - chegar no fim de um filme e apanhar uma frase e com ela reconstruir o sentido - dizem-me muito.

sábado, abril 21, 2007

Old Joy

A minha segunda tentativa Indie 2007, desta vez feliz e acordada. Old Joy de Kelly Reichardt. O menino que está debaixo do saco de campismo é mesmo o Will Oldham, cantautor de matiz folk. São dois velhos amigos que já não se vêm assim tanto (um deles já é quase pai e o outro teima em não crescer) seguem viagem rumo às Cascade Mountains, em Oregon. Procuram uma nascente de água quente. Sem o saber ou querer procuram quem foram, quem são e onde vão. Uma busca espiritual que dura um fim-de-semana. Old Joy é a alegria nostálgica do encontro, a constatação de que a cumplicidade não se esgota, nem acaba, mas antes sofre o poder transformador do tempo. Tão concentrados que andamos na conceptualização de maniqueísmos, surpreendemo-nos com a dica da personagem de Will: Sorrow is nothing but worn out joy. A tristeza não é assim tão contrária à alegria. É filha dela.

terça-feira, fevereiro 13, 2007

Um amor em transformação

Quando Joaquim Diabinho se apaixonou por Anne Wiazemsky, esta fixação "em Anne obrigou-o a ver Au Hasard Balthazar, Teorema de Pasolini, Rendez-Vous, (de Téchinè) vezes sem conta." E isto que leio num blogue chamado Esculpir o tempo, ouço-o primeiro por cima do ombro, ele é meu colega de trabalho. E quando ele mo diz, é já um homem de cinquenta anos. Na altura Anne Wiazemsky tinha dezoito anos e representava o papel de uma adolescente. O Joaquim tem catorze, por isso apaixonou-se por uma rapariga um pouco mais velha do que ele. E pela vida fora nunca mais se separou, virtualmente, deste amor por ela e muito especialmente por Marie. Eu provoco-o, como é que hoje aos cinquenta justificas que continuas a sentir-te apaixonado por essa adolescente de Au Hasard Balthazar?. Saímos os dois para o café entretidos nisto, a divagarmos sobre o trabalho não só que o tempo faz em nós, também a esse esculpir do amor em transformação.